Homens e mulher que sofreram
agressões detalharam a ação cruel dos agressores
Duas pessoas que participaram
da sessão de tortura praticada contra três pessoas no último dia 9, estavam
trajando uniformes da Guarda Municipal de Marabá, Pará, conforme relataram as vítimas
em depoimento prestado à Polícia Civil. Uma destas pessoas, Naiara Vieira
Ribeiro, de 25 anos, foi encontrada morta a tiros na madrugada do último sábado
(14), na Folha 34, cinco dias após ter denunciado o primeiro crime, que
envolveu também estupro e ameaças de morte.
Na manhã de ontem,
segunda-feira (16), a equipe da 21ª Seccional Urbana de Polícia Civil cumpriu prisão
preventiva contra o agente Rômulo Passos Soares, conhecido como R. Passos
na Guarda Municipal. O caso foi divulgado pelo portal Correio de Carajás. Ele é
suspeito de participação nos atos de tortura e foi reconhecido, por meio de
fotos, pelas vítimas.
Conforme apurou a Reportagem, constam na decisão judicial,
expedida pelo juiz Alexandre Hiroshi Arakaki, respondendo pela Vara de Plantão
de Marabá, detalhes sobre os momentos de horror que as três vítimas passaram
nas mãos dos agressores. A decisão foi decretada no sábado, após a morte de
Naiara.
Em depoimentos, Naiara e dois amigos dela, todos dependentes
químicos, estavam ingerindo bebida alcoólica em frente a um hotel, na Folha 34,
quando foram abordados por três homens, sendo dois fardados de guardas
municipais. As vítimas foram agredidas e, em seguida, colocadas à força no
interior de um veículo Voyage, de cor prata. A placa do automóvel foi fornecida
à Polícia Civil que descobriu se tratar do carro que pertence à mãe do agente.
Da Nova Marabá, os três homens levaram Naiara e os amigos até um
matagal no Bairro Cidade Jardim. Lá, eles foram torturados com utilização de
armas de choque e sofreram golpes a pauladas, tendo todos os pertences e
dinheiro subtraídos. As vítimas relataram, ainda, que as roupas delas foram
queimadas e que foram obrigadas a praticarem sexo entre si. Naiara ainda foi
violada por um dos criminosos.
Os três amigos, por fim, foram ameaçados com utilização de armas
de fogo - revólver e pistola - e ouviram que caso houvesse denúncia, tanto os
três quanto familiares deles morreriam. Após a denúncia, o delegado
plantonista Luiz Otávio Ernesto de Barros abriu inquérito e passou a colher
informações, chegando ao nome do guarda municipal.
Ouvido ontem, pelo Jornal CORREIO, se ateve ao caso da tortura,
mas deixou claro que há muito a ser investigado ainda. "Chegou ao
conhecimento da Polícia Civil a informação de que integrantes da Guarda
Municipal estariam praticando vários crimes, usando inclusive fardamento da
Guarda. A partir disso, realizamos diligências e localizamos três vítimas de
crimes gravíssimos, começamos a realizar diligências e tentamos até realizar a
prisão em flagrante, quando ainda não sabíamos quem estava cometendo os crimes,
tínhamos apenas o veículo que estava sendo utilizado”, relata.
Ainda de acordo com ele, não sendo possível a prisão em
flagrante, as diligências continuaram, até que as vítimas identificaram um
deles por fotografias. “Foi identificado e prontamente acionamos o Poder
Judiciário e fizemos a representação pela Prisão Preventiva”, relata.
As vítimas assinaram auto de reconhecimento por fotografia do
agente Rômulo Passos Soares, apontando ele, inclusive, como o responsável pelas
agressões sexuais praticadas contra Naiara. O guarda municipal já responde a um
processo junto ao Tribunal de Justiça do Estado do Pará por crime de tortura,
com outros cinco agentes, registrado em 2013.
DEFESA
Na manhã de hoje, terça-feira (17), o advogado Odilon Vieira
Neto, que acompanha o caso, informou ter conversei com o Guarda Municipal e
este negou as acusações. “Ele afirma que não cometeu delito algum e é inocente.
Ainda não tive acesso ao acervo probatório para verificar a efetiva acusação
contra o guarda. Possivelmente após conhecer o inquérito policial iremos
impetrar um habeas corpus no TJPA”, declarou Vieira.
HOMICÍDIO
Sobre o assassinato de Naiara, o delegado Luiz Otávio explicou
que este procedimento está a cargo do Departamento de Homicídios da Polícia
Civil. “O inquérito que estou presidindo é a respeito da tortura e da extorsão,
bem como do estupro. Não podemos nem descartar e nem atribuir tal crime a tal
conduta e a prisão não tem relação ao homicídio, é em relação ao crime anterior
a isso", explica o policial, acrescentando que o agente deve responder por
tortura qualificada, extorsão qualificada e estupro.
Perguntado se outras pessoas já foram identificadas no caso da
tortura, o delegado fez questão de deixar claro que está trabalhando com total
sigilo nessas investigações porque os procedimentos ainda estão em andamento.
“Continuamos trabalhando em sigilo para que todos os envolvidos sejam
identificados. A situação é essa e vamos tentar identificar todos para que
sejam punidos e o inquérito seja remetido ao Poder Judiciário”, adianta.
A delegada Raissa Beleboni, titular do Departamento de
Homicídios, também concedeu entrevista na tarde de ontem, afirmando que Naiara
foi alvejada por vários disparos de arma de fogo contra a cabeça. “Segundo
informações colhidas no local, ainda poucas, a Naiara foi alvejada por cerca de
seis disparos. Não há informações ainda sobre o histórico preciso da vítima,
apenas os dados colhidos no local. Ao longo dessas diligências apuramos que a
Naiara estava sendo apontada como vítima de uma investigação de outra
autoridade policial, delegado Luiz Otávio, e a possibilidade ou não dos dois crimes
estarem relacionados vai ser analisada e investigada ao longo das diligências
para apuração da morte de Naiara”, declarou.
Segundo ela, ainda não há correlação apontada entre os crimes.
“Nós vamos investigar para saber se há alguma possibilidade da morte dela estar
relacionada ao fato investigado pelo delegado Luiz Otávio”. Ela deixou claro
que, até ontem, o Departamento de Homicídios não tinha ciência da primeira
investigação e que somente quando as informações forem repassadas oficialmente,
serão analisadas e investigadas paralelamente.
“Serão identificadas para serem ouvidas pessoas próximas da
vítima, possíveis testemunhas do fato ou pessoas que soubessem os motivos pelos
quais ela poderia ser morta. A partir daí, vamos apurar se há possibilidade ou
não de haver relação entre os crimes. Por enquanto, apesar de coincidente, ela
figura como vítima de dois crimes distintos. Só ao longo da investigação vamos
poder afirmar se há ou não correlação entre eles”, finalizou.
GUARDA MUNICIPAL
Por telefone, o titular da Secretaria Municipal de Segurança
Institucional (SMSI), Jair Barata Guimarães – a quem a Guarda Municipal está
subordinada –, confirmou que tão logo recebeu informação sobre a prisão do
agente, seguiu para a 21ª Seccional Urbana de Polícia Civil, acompanhado do
chefe da GM, Roberto Lemos, e mantiveram audiência com a delegada Simone
Felinto, diretora da Seccional.
Na ocasião, foram informados sobre o motivo da prisão e tiveram
acesso ao inquérito policial. De imediato, Jair determinou abertura de Processo
Administrativo Disciplinar para apurar a responsabilização do acusado. Ao mesmo
tempo, ele disse que dará assistência à família do agente e já acionou o
advogado da categoria para defender R. Passos.
O secretário não quis adiantar nenhuma opinião sobre o caso, mas
afirmou que tudo será feito dentro dos rigores da lei. “Não vamos passar a mão
na cabeça de ninguém”, resumiu Jair Barata, acrescentando, por outro lado, que
o agente tem direito a ampla defesa e ao contraditório. Aliás, R. Passos se reservou
ao direito de ficar calado no depoimento ao delegado Luiz Otávio e só deve se
manifestar em juízo.
Por fim, Jair Barata pediu que
a população não perca a confiança na Guarda Municipal, pois se trata de uma
instituição nova, que veio para melhorar a segurança na cidade e que deve,
inclusive, aumentar seu leque de atuação. (Chagas
Filho e Luciana Marschall com informações de Evangelista Rocha)
Correio de Carajás
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