Para MPF, informação reforça a necessidade de manutenção do
atual conceito do crime
Trabalhador que em 2008 afirmou ter sido marcado a ferro quente pelo patrão e dois capangas no Pará (foto: SRTE-PA / divulgação, via Repórter Brasil) |
A nova lista suja
do trabalho escravo, divulgada neste domingo (22), pelo Fantástico, da TV Globo,
apresenta 16 estabelecimentos – a maioria fazendas – instalados no Pará entre
os 131 estabelecimentos em todo o país publicados no documento.
O número deixa o
estado na segunda colocação, só perdendo para Minas Gerais, com 42 empregadores
infratores.
Em números de
trabalhadores escravizados, o Pará fica na terceira posição, com 116 pessoas
flagradas sendo submetidas a condições semelhantes às da escravidão. Minas
Gerais registra 1008 casos, e o Paraná tem a segunda posição, com 156
escravizados.
A lista suja é uma
relação de empreendimentos em que houve flagrante de trabalho escravo e cujos
responsáveis foram condenados administrativamente por decisão contra a qual não
cabe recurso. Caso os infratores paguem as multas devidas e não voltem a praticar
a escravidão, o nome do estabelecimento pode deixar a lista suja após dois
anos.
O documento tem
sido utilizado, por exemplo, como apoio para empresas no momento da decisão de
contratar ou não fornecedores citados na relação de infratores.
Confira
aqui a íntegra da lista suja.
Confirmações - “O fato de
o Pará aparecer entre os primeiros colocados em um ranking do
trabalho escravo confirma o quanto o problema é persistente no estado.
Lamentavelmente, estamos entre os campeões desde que as fiscalizações
começaram. De 1995 pra cá, já foram resgatados mais de 50 mil trabalhadores no
país, e pelo menos um quarto desse total estava no Pará”, critica o
procurador-chefe do Ministério Público Federal (MPF) no Pará, Alan
Mansur.
Segundo ele, esses
dados também confirmam o quanto prejudicial pode ser a alteração do conceito de
trabalho escravo, proposta na semana passada pela portaria 1.129, do Ministério
do Trabalho e Emprego (MTE). A nova regra reduz os elementos que indicam o
trabalho escravo, de forma que a jornada excessiva ou a condição degradante só
poderão ser comprovadas quando for constatada a restrição de liberdade do
trabalhador, eliminando os outros elementos dispostos na legislação.
“Se com as leis que
tem o Brasil não conseguiu eliminar o crime, não é afrouxando essas regras que
o país terá sucesso”, comenta o membro do MPF. “O poder público tem que fazer o
caminho oposto: buscar intensificar a fiscalização e a punição”.
Também na semana
passada o MPF e o Ministério Público do Trabalho (MPT) recomendaram ao ministro
do Trabalho, Ronaldo Nogueira, a revogação imediata da portaria. Para o MPF e o
MPT, a portaria é ilegal por contrariar o artigo 149 do Código Penal, que
define como caracterização de condição análoga à de escravo a submissão a
trabalhos forçados, jornada exaustiva, condições degradantes de trabalho e
restrição da liberdade do trabalhador.
Outro ponto
preocupante previsto na norma é a eliminação da servidão por dívida, também
prevista no Código Penal. A partir da publicação, a empresa só poderá ser
autuada pelo crime quando houver uso de coação, cerceamento do uso de meios de
transporte, isolamento geográfico, segurança armada para reter o trabalhador e confisco
de documentos pessoais. Segundo os membros do Ministério Público que assinam a
recomendação conjunta, a nova portaria dificulta a persecução penal de empresas
que cometem o crime e representa um grave retrocesso no combate ao trabalho
escravo.
Burocratização – As mudanças
na confecção do relatório de fiscalização do MTE e a responsabilidade de
inclusão de empresas na lista suja do trabalho escravo também são alvo de
preocupação dos Ministérios Públicos Federal e do Trabalho.
Isso porque a
inclusão e divulgação da lista de empresas flagradas infringindo a lei, antes
feita por técnicos do MTE, passa a ser atribuição exclusiva do ministro do
Trabalho. A inclusão da empresa na lista suja implicava a permanência de um ano
no cadastro, bem como o pagamento de débitos trabalhistas e indenizações ao
trabalhador. Com a portaria, as obrigações do empregador são extintas.
A recomendação
também critica a burocratização do relatório para autuação da empresa. Antes, o
documento consistia em um relato das condições irregulares encontradas durante
as fiscalizações. Pelas novas regras, o documento deve conter um boletim de
ocorrência lavrado por policial que tenha participado do flagrante. A equipe
técnica do MTE também deverá enviar ofício à Polícia Federal com fotos de todas
as irregularidades.
A recomendação é
assinada pela procuradora da República Ana Carolina Roman, representante do MPF
na Comissão Nacional para Erradicação do Trabalho Escravo (Conatrae), pelo
procurador do Trabalho Thiago Muniz Cavalcanti, representante do MPT na
Conatrae, pela coordenadora da Câmara Criminal do Ministério Público Federal,
subprocuradora-geral da República Luiza Frischeisen, e pela procuradora federal
dos Direitos do Cidadão, Deborah Duprat.
O documento foi
entregue em mãos pela procuradora-geral da República, Raquel Dodge, ao ministro
do Trabalho.
Ministério Público Federal no Pará
Com informações da
Secretaria de Comunicação da Procuradoria-Geral da República.
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