Impressiona, mas não causa estranheza,
a postura acuada, com o rabo entre as pernas, do governo de Michel Temer diante
da forte pressão e corte em 50% dos investimentos do governo da Noruega no
Brasil para ações de preservação da Amazônia. Pior do que isso: Temer ouviu
calado, sem reagir, que a Noruega reduzirá a zero os investimentos na Amazônia
caso o governo não enfrente o desmatamento na região.
A Noruega é a maior doadora do Fundo Amazônia, instituído em
2008 para captar recursos para ações de prevenção, monitoramento e combate ao
desmatamento e para promover o uso sustentável da floresta. É claro que essa
ajuda é benvinda e a preocupação dos capitalistas noruegueses com as agressões
diárias ao meio ambiente amazônico é algo comovente.
Afinal, a Noruega já tirou de seus cofres R$ 2,8 bilhões, valor
mais de 45 vezes maior que o da segunda colocada na lista de ajuda, a Alemanha,
com R$ 60,7 milhões, de acordo com dados disponíveis no site do Fundo da
Amazônia. O último aporte norueguês, realizado em dezembro de 2016, foi de R$
330 milhões.
Por outro lado, há um certo cinismo, escondido em fato
gravíssimo, que compromete diretamente o governo da Noruega: o exemplo de
preservação e respeito à Amazônia, que aquele país nórdico cobra do Brasil, uma
grande empresa da própria Noruega, implantada no coração do Pará, a Norsk Hydro,
não é cumprido por ela. Pelo contrário, há denúncias de total desprezo ao solo,
aos rios – responde a 15 processos por crimes ambientais – e ao povo de
Barcarena, a 25 km de Belém, onde mantém seus lucrativos negócios.
Solitariamente, o Ver-o-Fato já mostrou numa série de matérias como o
poder exercido pela Hydro junto aos governos estadual e federal – sob o
discurso hipócrita de produzir progresso, desenvolvimento, emprego, renda e bem
estar para a população de Barcarena – tem deixado um rastro de degradação
social e ambiental sob as bençãos de completa impunidade pelas autoridades
brasileiras.
Vamos a um resumo dessas reportagens – que podem ser baixadas na
íntegra nos arquivos do Ver-o-Fato: a Hydro comprou e hoje é dona da
refinaria Alunorte, atualmente sob o nome Hydro Alunorte, a maior do mundo em
alumina. Ela transforma a bauxita, um mineral abundante na Amazônia, em
alumina. A Hydro, para quem não sabe, tem na sua composição acionária 34,3% do
Estado norueguês, 6,81% do Fundo de Pensão do Governo da Noruega, além de
diversas empresas transnacionais financeiras.
Mas não é só isto: a Hydro também detém a maioria do
capital da vizinha Albrás – Alumínio Brasileiro S.A., que transforma a
alumina da Alunorte em alumínio. A Hydro possui 51% das ações, contra 49% do
consórcio japonês NAAC – Nippon Amazon Aluminum Co.Ltd. Ou seja, para expandir
sua planta de produção e ao mesmo tempo armazenar o perigoso rejeito do
alumínio, a norueguesa precisa de terras.
E o que ela fez? Desde 2010, a Hydro vem expulsando famílias de
diversas comunidades para ficar com as terras. Isso já ocorreu com 700 pessoas
da comunidade Jesus de Nazaré e com outras de comunidades tradicionais
como Tauá, Japiim, Arienga Santa Rosa, São Sebastião e área do trevo do
Peteca. Elas deixaram as terras, chamadas até de “marginais” pela empresa, e ingressaram
na justiça, mas até agora o mérito da causa não foi julgado.
A estória é longa e para entendê-la basta ler a série de
matérias arquivadas no blogue. Para resumir: no dia 10 de abril passado,
líderes das comunidades expulsas das terras pela Hydro estiveram em Brasília e
durante duas horas mantiveram reunião com Aud Marit Wiig, embaixadora da
Noruega no Brasil. Eles entregaram a ela um dossiê, relatando a postura da
empresa.
A embaixadora
da Noruega (centro) prometeu dar conselho à Hydro
|
Para surpresa de todos, porém, após
tomar conhecimento das denúncias contra a Hydro, a embaixadora limitou-se a
dizer que apenas daria “um conselho” à Hydro, pois não tinha mandato para
negociar em nome da empresa ou para exercer um papel mediador. Aud Marit Wiig
ouviu dos comunitários de Barcarena que o caso seria levado “às cortes internacionais,
inclusive à ONU”. Deu de ombros.
Vamos e venhamos, é muito fácil para o governo da Noruega, sócio
da Hydro em seus negócios do Pará, fechar o caixa anualmente e conferir
polpudos lucros por explorar nossas riquezas, embora deixando pegadas visíveis
de agressão ao povo e à natureza, poluindo rios e igarapés de Barcarena,
enquanto se arvora ao papel de moralista das causas ambientais e protetor da
Amazônia.
A Noruega, como se vê, pratica um moralismo ambiental de cuecas,
deixando o bumbum de fora. Fala muito e nem sempre cumpre o que prega para o
mundo. A Norsk Hydro está aí para provar isso. É como diz um trecho da
letra de “Stay On These Roads”, da cultuada banda de rock A-Ha, que por sinal é
norueguesa e, dizem as más línguas, seria sócia da Hydro por estas bandas
tupiniquins.
Ver-O-Fato
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