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terça-feira, 31 de dezembro de 2013

Garimpeiros da Amazônia lutam para permanecer em suas terras

Por Sue Branford*




Com a impressionante febre do ouro que tomou conta da bacia do rio Tapajós após o metal ter sido descoberto ali em 1958, milhares de garimpeiros se deslocaram para a região.
Apesar de apenas alguns poucos terem enriquecido, a maioria conseguiu um padrão de vida bem melhor do que conseguiria com a extração da borracha, a pesca ou a agricultura de subsistência.

Embora a atividade tenha minguado nos últimos anos, muitos homens continuam a trabalhar em minas de ouro primitivas e em situação irregular.

A descoberta de vastas reservas de ouro no subsolo colocou os garimpeiros de pequena escala em conflito com grandes mineradoras modernas.

As reservas do subsolo são inacessíveis pelos métodos de mineração artesanal dos garimpeiros, mas há empresas multinacionais dispostas a reivindicar estas riquezas intocadas.

ExpulsãoA vila de São José no rio Pacu está no centro de um desses conflitos entre garimpeiros e a empresa mineradora Ouro Roxo Participações.

Há alguns anos, a Ouro Roxo Participações, que faz parte do grupo de mineração canadense Albrook Gold Corporation, registrou o direito a mineração do subsolo da mina Paxiúba, onde garimpeiros continuam a extrair ouro usando os mesmos métodos artesanais.

Em março de 2010, a polícia federal e representantes do governo chegaram e ordenaram a saída dos garimpeiros.

Eles saíram, com muita relutância, argumentando que suas famílias viviam na região há mais de meio século, período no qual haviam adquirido o direito sobre a terra.

O líder garimpeiro José Gilmar de Araujo afirma que, desde então, eles têm procurado incansavelmente obter a legalização de suas atividades minerárias, levando a solicitação até a capital federal.

Contudo, afirma, "não estamos chegando a parte alguma".

Vida no garimpo
São José não é mais tão movimentada quanto no passado, mas continua a ser, conforme são chamadas as vilas de garimpeiros, uma currutela em atividade.

As lojas ao redor da praça central, que também serve como campo de futebol, vendem mercadorias a preços inflacionados.

Os vendedores chegam a cobrar US$5,00 (R$12,00) por um quilo de cebolas, usando pequenas balanças para pesar o pagamento em ouro.
As lojas aceitam pepitas de ouro como pagamento por mercadorias

Existem quatro bordéis. Durante a semana, mulheres entediadas ficam no bar servindo bebidas.

Mas, durante os finais de semana, os bordéis ganham vida.

Os garimpeiros chegam das minas nas proximidades e, depois do ouro obtido ser extraído no fogo, gastam o dinheiro ganho a duras penas.

No início, havia muita violência em São José, contam os moradores.

"Quando eu cheguei aqui em 1986, quase todo dia alguém morria baleado", relembra Ozimar Alves de Jesus, proprietário de um bordel.

Hoje, a vila é um lugar tranquilo.

Traficantes de drogas são convidados a se retirar e a associação comunitária realiza assembleias regulares para solucionar quaisquer problemas que possam surgir.

As prostitutas são aceitas. Há muitos casos de mulheres que chegaram para trabalhar nos bordéis, casaram-se com garimpeiros, e agora administram negócios bem-sucedidos.
São José tornou-se mais pacífica desde seu primórdio violento
Jogo de azar

Os garimpeiros extraem o ouro cavando primeiramente um poço vertical, a partir do qual galerias, ou túneis horizontais, se ramificam.

Trata-se de um trabalho duro e é impossível prever quais galerias renderão bons lucros.

Para muitos, aí é que está a atração na vida do garimpeiro. "É como ir a um cassino", confessa um garimpeiro enquanto explica por que os garimpeiros voltarão para as minas repetidas vezes na esperança de encontrar um filão valioso.

O principal problema encontrado por eles está na incerteza sobre o futuro da mina em si, e no poder que as grandes empresas mineradoras detêm.

"Uma empresa grande chega e as portas se abrem para ela", afirma o garimpeiro José de Alencar.

"Elas conseguem regularizar suas atividades da noite para o dia. Parece que existe uma lei para as grandes empresas e outra para nós."
Garimpeiros trabalham nas minas de forma artesanal, cavando túneis básicos
Ocupação
Após sua expulsão em 2010, durante três anos os garimpeiros tentaram obter autorização para retornar à mina Paxiúba.

Em 12 de junho de 2013, eles decidiram resolver o assunto a seu próprio modo e reocuparam a mina.

Gilmar de Araujo afirma que foram motivados pela "necessidade econômica".

Pusemos todo nosso dinheiro nessa mina. Estaremos arruinados se não pudermos produzir ouro"

Eles continuam ali, garimpando. Enquanto isso, a Ouro Roxo Participações está perdendo dinheiro e furiosa.

"Se eles continuarem a garimpar, acabarão inviabilizando todo o nosso projeto por causa dos estragos que causam", afirmou Dirceu Santos Frederico Sobrinho, acionista brasileiro da empresa.

"Os garimpeiros não evoluem. Eles estão presos a uma cultura de pobreza, prostituição e drogas", acrescenta.

Segundo Antônio João Brito Alves, advogado dos garimpeiros, o conflito está aumentando.

Santos Frederico teria afirmado que ele e sua família "sofrerão as consequências" caso o advogado não abandone o caso Paxiúba.

Santos Frederico nega veementemente ter ameaçado Brito Alves.

As ramificações deste conflito podem ter implicações mais abrangentes.

Se os garimpeiros ganharem, ou se receberem uma indenização significativa por deixarem a mina, é provável que muitas outras comunidades de garimpeiros apresentem a mesma demanda. 

A pequena vila de São José converteu-se em um caso paradigmático improvável na luta mais ampla pelos direitos dos garimpeiros.


*Sue Branford foi correspondente no Brasil de diversos meios de comunicação internacionais.  Atualmente faz parte do Latin America Bureau . Matéria originalmente publicada na BBC com o título Amazon gold workers fight to stay in their mine em 26 de dezembro de 2013 e gentilmente traduzida para o blog Língua Ferina por Andréa Castellano Mostaço. Fotografias e vídeo Naya Fernandez.



Língua Ferina

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